Em "O Som do Silêncio" (Sound of Metal, em inglês), de Darius Marder, Riz Ahmed interpreta Ruben Stone, um baterista viciado em drogas que vive da música e mora em um trailer com Lou (Olivia Cooke), sua namorada e vocalista da banda. Subitamente ele perde a audição e se muda para uma comunidade de surdos em tratamento contra o vício aos cuidados de Joe, personagem interpretado por Paul Raci. Com uma vida de exageros, Ruben abusou de sons altos e heroína, o que acabou deteriorando a sua audição. Para alguém que tem a música como grande sonho, o drama da surdez é devastador para o rapaz.
Mas muito diferente do que podemos pensar, "O Som do Silêncio", ganhador de duas estatuetas do Oscar - de Melhor Som e de Melhor Montagem -, não é sobre deficiência. Vai muito além de apenas aceitar e ressignificar a nova realidade. É um filme sensível o suficiente para não se bastar em sofrimento. É, na verdade, uma experiência de ver o mundo, junto com Ruben, sem escutar o que quer que seja.
O som do filme traz aquilo que os teóricos chamam de janela cinematográfica: a possibilidade de olhar por essa janela e sentir o personagem. Com a incrível edição e mixagem de som, nós experimentamos tudo que ele consegue, ou não, ouvir, de uma forma que o silêncio e o ruído fazem parte da história.
Joe, o seu guru na comunidade de surdos, o ensina a língua de sinais. No longa é utilizada a ASL (American Sign Language). A legenda para esses momentos só é usada quando Ruben de fato aprende a nova forma de se comunicar. O ator de fato aprendeu a língua para atuar com o elenco de dezenas de pessoas surdas.
O filme mostra uma perspectiva mais afunilada da comunidade surda, erguendo a bandeira da comunicação pela língua de sinais, língua materna e garantida por direito, mas muitas vezes é negada e excluída pela sociedade, levantando sempre a série de questões: “E se fizer implante? E se utilizar aparelho? E se fizer leitura labial? E se...?”. Tudo isso em vez de incluir políticas públicas para acessibilidade efetiva e negando direitos básicos como igualdade para todos, tornando os surdos “estrangeiros no próprio país”.
O guru, Joe, deixa bem explícito que surdos que se apropriam de sua identidade surda e usam a comunicação por sinais como língua não estão quebrados, não precisam ser consertados, mas precisam que as barreiras impostas pela sociedade sejam quebradas. Permitindo, assim, conviver, interagir, trabalhar - seja com auxílio da tecnologia, seja com profissionais que entendam a língua ou simplesmente com tratamento respeitoso, comunicação direta, independente e olho no olho.
A obra ainda dá voz a políticas públicas para a comunidade surda no meio cinematográfico e audiovisual. Não apenas para que os surdos entendam os filmes, mas para que participem deles. Marlee Matlin, por "Filhos do Silêncio", de 1986, é a única atriz surda até hoje a conquistar um Oscar.
Historicamente, o cinema é usado como ferramenta política de discussão. Nesse sentido, o filme surge como como um passo dado pela Academia para discussão de questões de acessibilidade e de inclusão na sociedade. Um passo, mesmo que mais tímido, importante para que os surdos sejam retirados da margem da sociedade, principalmente no cinema mundial.
Vale lembrar que, no Brasil, a Língua Brasileira de Sinais (Libras) é reconhecida como meio de comunicação pela Lei nº 10.436 de 24 de abril de 2002 - regulamentada pelo Decreto nº 5.626, de dezembro de 2005. Mas ainda há luta para que seja cumprida e alcance todos e esperança de dias melhores para todos com políticas públicas, movimentos e olhar inclusivo e humano por parte de empresas públicas e privadas.
Luis Debiasi e Joab Mariano | Equipe LIBRAS-SE
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